Unha introdución ao Mamulengo

As claves do títere tradicional brasileiro da man da profesora Izabela Brochado

Escena de “Marieta e o Boi Bumbá”, mamulengo de Trapusteros Teatro.

A VIII Edición do Titiriberia presta unha especial atención a esta forma de títere brasileiro. Unha exposición, visitas guiadas, un curso e, por suposto, actuacións escénicas, amosan esta tradición de bonecos de luva estreitamente emparentada coas formas europeas da que fai parte Barriga Verde. Para coñecermos mellor este patrimonio, achegamos un texto da professora Izabela Brochado a introducir as súas peculiaridades.  

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Fragmento do artigo “A participação do público no Mamulengo pernambucano” publicado originalmente na Revista Móin-moin

Izabela Brochado. Universidade de Brasília (UNB)

Ainda hoje podemos encontrar no interior de Pernambuco espetáculos de Mamulengo que mantém certas características que em outros contextos já foram alteradas. Estes espetáculos são destinados mais especificamente ao público adulto, embora sejam também assistidos por crianças. São geralmente realizados na rua (na zona urbana) ou no terreiro dos sítios (na zona rural). Geralmente iniciam-se por volta das 20h e podem durar por até seis horas.

O público é composto por pessoas de ambos os sexos e diferentes idades. No entanto, a partir de uma determinada hora (geralmente 23h) ele passa a ser composto basicamente por adultos do sexo masculino. Os espetáculos são resultantes de contrato feitos por pequenos comerciantes, em geral donos de bares, com o intuito de atrair clientes. Isto também ocorre na zona rural, uma vez que em muitos sítios funcionam pequenos bares que complementam a renda familiar de agricultores. Em geral, o contratante paga um pequeno cachê, ficando por conta do grupo a coleta suplementar de dinheiro que é feita durante todo o espetáculo. Assim sendo, tanto o contratante quanto o mamulengueiro têm interesse em prolongar o espetáculo, uma vez que isso significa maior arrecadação para ambos.

A duração do espetáculo depende principalmente do público. É a sua participação ativa que consolida o sucesso da brincadeira e conseqüentemente, um satisfatório retorno financeiro.

O grupo

Diferentemente de outros contextos, na Zona da Mata o grupo é composto por cerca de seis artistas. Dentro da barraca ficam o mestre mamulengueiro, um contra-mestre e às vezes um, ou mais, ajudantes. Do lado de fora estão Mateus (o intermediário) e os músicos (sanfona de oito baixos; triângulo ou ganzá; caixa ou zabumba). Mateus é uma mistura de mestre-de-cerimônias e palhaço e tem um papel fundamental na dinâmica e ritmo da brincadeira, uma vez que dialoga constantemente com bonecos e com o público, servindo de ponte entre eles. Ele ainda atua como informante do mamulengueiro, passando-lhe dados sobre indivíduos presentes na platéia e sobre os eventos que acontecem no espaço externo da barraca.

O espetáculo

O espetáculo é composto por uma seqüência de diferentes cenas (passagens) que abordam temas diversos sem aparente conexão entre si. Em geral, o mamulengueiro possui por volta de 20 diferentes cenas, que raramente são apresentadas todas no mesmo show. A seleção e ordenação das cenas dependem do contexto da apresentação, ou seja, do local, do público a que se destina e do tempo disponível para a realização do espetáculo.

A maioria das cenas faz parte do repertório tradicional do Mamulengo e em geral, apresentam convenções e regras específicas que os mamulengueiros podem seguir de forma mais ou menos acurada. Elas possuem um número fixo de personagens (principais e secundários) com tipologias (atributos físicos e psicológicos) e papéis bem definidos. Outras, entretanto, são criações individuais que apresentam estruturas mais flexíveis e abordam temas mais recentes.

O texto é um esquete básico sobre o qual são construídos os diálogos a partir da participação direta do público. Porém, importante ressaltar que os mamulengueiros possuem um rico repertório de fórmulas lingüísticas cômicas bem codificadas (muitas vezes em forma de verso) que são usadas em diferentes momentos do espetáculo.

A música, sempre tocada ao vivo, abrange quase um terço da totalidade do show e apresenta diversas funções: serve de chamariz para os espectadores dispersos; entretém os que já estão presentes aguardando o início do espetáculo; conecta as diversas passagens; pontua o ritmo das cenas de dança e de luta; e age como elemento importante na caracterização dos personagens principais, uma vez que estes possuem canções específicas que revelam informações importantes sobre suas tipologias.

Participação do público

O público participa intensa e constantemente, seja por manifestação mais coletiva (vaias, assovios, gritos e xingamentos), ou mais individualizada, que são: respostas às perguntas feitas pelos bonecos e por Mateus; conselhos dirigindo as ações dos bonecos; comentários (positivos e/ou negativos) às falas e ações dos bonecos; oferecimento de comida e bebida aos bonecos; contato físico com os bonecos manifestado através de toque, que tanto pode indicar a qual boneco se refere ou ser resultante de manifestação de carinho (carícias) ou raiva (empurrões e tapas); apostas (em dinheiro) para que um ou outro boneco faça uma determinada ação, o que, muitas vezes, decide o desfecho das cenas; participação na seleção das cenas.

Esta ativa forma de interação está ligada principalmente a três aspectos que estão interligados e são, portanto, complementares. São eles: especificidade do público; temática e linguagem empregada no espetáculo e estratégias de ativação da platéia empregadas pelos mamulengueiros.
(…)

Temas

Os temas presentes nas cenas referem-se principalmente à inversão de hierarquia, sexualidade e disputas entre valentões. Também falam das festas, folguedos, superstições e crenças, entre outros, todos abordados com fins cômicos.

Inversão de hierarquia aparece sob diferentes formas, evidenciando as diversas estratégias usadas pelos personagens representantes do povo no enfrentamento — e quase sempre nas vitórias — contra os representantes dos poderes terrenos (fazendeiros/ coronéis, policiais, fiscais, doutores, padres) ou metafísicos (morte, diabo, e outros seres sobrenaturais). Não importa se o confronto é expresso de maneira explícita (luta quase sempre seguida de morte), ou de maneira mais sutil (traição, malandragem, exposição ao ridículo), o público imediatamente se identifica com esta inversão de poderes.

Oposições também ocorrem entre os personagens representantes do povo. Disputas verbais, lutas e mortes entre valentões (os “machos”) acontecem por motivos diversos, como mulheres, preconceitos, bebedeira, ou por pura demarcação de território, como a escolha de uma música em um baile. Na maioria das vezes, os adversários são de um lado um jovem negro e de outro, um branco idoso. Os seus atributos podem ser entendidos como demarcações onde se opõem raças (negro x branco) e idades (jovens x velhos).

Sexualidade, obscenidade, funções e decrepitude do corpo estão representados nos elementos visuais (figuras, movimentos e gestos) e no texto. Sexualidade é expressa tanto por referências explícitas (representação das genitálias nas figuras dos bonecos e paródias de intercoito sexual) quanto por alusões mais sutis (trocadilhos e frases de duplo sentido). O tema também aparece nos inúmeros conflitos matrimoniais que são sempre resultantes de possíveis traições e nas referências à procriação, quase sempre se usando imagens hiperbólicas: Catirina está grávida e já teve 116 filhos, “58 de uma mesma barrigada;”11 Ritinha teve 114 filhos. Sexo/vida se confrontam com a morte. A viúva está constantemente engajada em novos casamentos: Ritinha já foi casada 38 vezes, a Viuvinha 26. Esta última, ao dançar com seu mais recente marido percebe que ele está “mole demais pra um homem.” Finalmente, quando se dá conta que ele está morto diz, sacudindo o boneco: “eu vou sacudir, sacudir, sacudir, até ele ficar duro de novo.”

As funções do corpo aparecem sob forma de arrotos, puns, urina, vômitos, etc. O corpo decrépito tanto se renova como encontra o seu inevitável fim. O Doente vomita sangue ou expele um imenso verme pela boca e é finalmente curado pela aplicação de uma injeção (clister) dada pelo Doutor. No entanto, Bambu, outro doente que insiste em vender sangue aos membros da platéia, tenta ludibriar a Morte por meio de uma cantoria, pedindo “à mulher magra, toda vestida de branco” mais tempo na terra: “Ô, morte tu não me mata, deixa eu viver mais um ano. (…) deixa eu viver mais um mês (…) deixa eu viver mais uns dias (…) deixa eu criar meus filhinhos”. Em vão, a Morte o carrega, pois seu tempo é findo.

O humor presente no Mamulengo, assim como na maioria das tradições populares de teatro de bonecos, é o humor carnavalesco de que nos fala Bakthin. Ele nasce na praça pública e é feito pelo povo e se opõe às estruturas oficiais. Ele está centrado no corpo, nas imagens grotescas do corpo ambivalente e nas atividades relacionadas ao carnavalesco: intercoito sexual, festas, bebedeiras, brigas, entre outras. O humor carnavalesco também está presente nas imagens e estilos de linguagem empregadas no Mamulengo. Elas revelam padrões que subvertem os discursos oficiais.

Para saber máis desta arte está en liña a Revista Mamulengo v. 01, n. 21 (2023) da Associação Brasileira de Teatro de Bonecos / Centro UNIMA Brasil.

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